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Um dia desses, passei por um dia difícil, e tudo que eu mais esperava da semana,  era correr meus cento e poucos metros, que fossem, por mera distração,  mas o único tempo que tive,  só me permitiu correr até a padaria mais próxima para garantir os pães do fim de tarde. Calmamente, respirei fundo, vesti meu melhor sorriso e me dirigi sem reclamar. Quando estacionei o carro e cruzava a rua, uma senhora magrinha, de estatura mediana, cabelos brancos,  e certa idade, tremia, em meio ao movimento de veículos que dificultavam sua travessia em segurança. De imediato, cruzei a rua, segurei em seu braço e levei-a até o outro lado. De contrapartida,  recebi um abraço e um sorriso,  acompanhado de palavras que me fizeram pensar o dia inteiro à respeito: "minha filha,  muito obrigada, que Deus te abençoe,  e que quando você chegue à minha idade, encontre alguém que te atravesse também, assim como você fez comigo". Naquele momento, apesar do quão triste me pareceu a dura realidade que se perfaz nas limitações da vida, uma enorme felicidade me invadiu,  e tive a certeza: valeu à pena estar viva para poder estar ali e atravessá-la, valeu a pena ter "perdido a hora" de praticar minha atividade física. De fato, nenhuma corrida solitária me preencheria com tanta felicidade quanto a de ver a esperança e gratidão estampada nos olhos de alguém. E foi então que eu, em minha humilde experiência existencial,  mais uma vez, entendi: a verdadeira felicidade é um tesouro,  e está nas pequenas atitudes cotidianas: no bem que fazemos,  no amor que doamos, no sorriso que nos destinamos a ofertar. "É impossível ser feliz sozinho". (A.C.N.A).

Sobre retorno e outras coisas.

Um dia já não eram os mesmos quadros, nem as mesmas cortinas, tão pouco, os mesmos raios de sol. Os amores foram embora, os amigos mandaram lembranças e seguiram seu caminho.  As bonecas na prateleira, fechavam os olhos, e os livros, conversavam sozinhos. Um dia, naquele quarto empoeirado, o tempo esqueceu-se de mim, e esqueci-me do tempo, do vento lá fora, de quem fui até ali.


Outro dia, depois de muitos outros, o vento tomou-me em dança, e flores, enfeitaram meu jardim. Tranquei a porta do quarto, fiquei do lado de fora, prometi em quatro versos: nunca mais retorno aqui. 

Mais dias foram passando, um, dois, três anos, enfim. Bateram forte na porta, vinha um som do outro lado, perguntando: alguém ai?

Pernas tremendo, algum receio, coração batendo, olhei de relance, abri. Eram as doces lembranças que a poeira de outrora já não me permitira sentir. Entrei, troquei as cortinas, abri as janelas, limpei a bagunça e sorri. Dancei com o vento, beijei meu solo, só então, respondi:  depois de tanto tempo, sou eu, acredite e não duvide, voltei, estou aqui!  

A.C.N.A




Todo dia quando acordo
agradeço ao meu Senhor
pela alegria e tristeza,
que tornam-me quem sou.

Olho pro céu e faço prece
peço como quem padece,
como quem na vida,
do amargo já provou.

Se um dia Deus me escuta
se um dia eu alcanço
a graça de calar meu pranto
e de viver meu canto
ei de eternamente amante,
agradecê-lo com fervor.

Ei de fazer um verso,
mostrando o inverso
do reverso,
do complexo que restou.

(A.C.N.A)

Vi,ver e outras coisas.





Minha vida, se eu contar não se acredita,
só confio eu que já vivi.

Não é que goste de maldizer a vida,
é que de tempestades e tristezas, muito sei e muito vi.

Da graça de viver,
nunca ei de discutir, 
mas ei de levar comigo,
a lembrança da tristeza e do sorriso,
que é pra eu crer e dar valor a beleza que há de vir.

 A.C.N.A


"Só aí vou ter certeza de fato, que eu fui feliz..." (Fotografia- Leoni)

Sobre o verão que me trouxe até aqui.




Foi um longo inverno, levou embora todo o vento quente de outono, com suas folhas secas, com seus galhos frágeis, e como um vendaval de frio e esquecimento, congelou todas as letras, todos os sonhos, congelou todos os planos que outrora foram feitos. Congelou todos os gestos, congelou também os versos que gritavam  "expressão". Congelou um rosto, no reflexo de um espelho, de um espelho de ilusão. Mas eis que chega o verão, e a natureza cinza revela-se numa explosão de cores, de luz, de vida simples, de sorriso fácil,  de flor do campo, de abraço amigo, de amor Divino, do pouco do muito que se precisa, para ser realmente FELIZ! 

Vento, fogo e mistério.




Ele era fogo vivo, forte, ágil. Tinha um semblante de quem nunca sofreu, de quem nunca provou dor alguma, de quem nunca chorou, de quem nunca sentiu frio, nem medo, nem nada, de quem nunca morreu de amores. Apresentava-se altivo e pomposo, trazia no caminhar a magnitude de um flamingo, e aparecia do nada, exalando suas cores, como que um apressado arco-íris a qualquer sinal de chuva. Mas tinha alguma coisa, alguma coisa em seu olhar que dizia mais do que queria, mais do que podia revelar, mais do que seu sorriso impecável conseguia esconder. Entre o perigo e o mistério que tomava conta da situação, Brígida escolheu arriscar. Logo ela que era desapego, simplicidade, vento de outono, vento forte, vento quente, com cheiro de dor, de inevitável  poeira escondida pelos cantos. Logo ela que, de tanto ir e vir, com tanta intensidade e pressa ao mesmo tempo, guardava consigo estórias de tantos passantes, estórias de lágrimas, de sorrisos, resquícios de amores proibidos, pelo tempo, pela vida, jogados ao léu.
Como pode fogo e vento permanecerem juntos, sem causar destruição? Pelo mistério valeria o risco. Iria descobrir, de uma forma ou de outra, porque desvendar silêncios e olhares perdidos em rostos de cera sempre foi seu hobbie predileto. Talvez porque houvesse aprendido, que por trás de todo sorriso tranquilo sempre existe um olhar inquieto.  

A.C.N.A

Há de brotar.




Entregava uma flor, sempre que conhecia alguém. Alguém que, de longe, valesse o sorriso estampado e o verso simples. No entanto, não fazia mais nada. Nada além de cuidar do que lhe restara: do jardim e das outras flores. Das que chegavam de vez em quando, das que plantava, e das que nasciam sem que percebesse. No mais, já havia plantado a semente. Esperava brotar ou deixava murchar, porque apesar de gesto simples, suas flores, eram pouco do muito que lhe restara, um verdadeiro complexo de beleza e dor. Seu jardim, que já não vinha tão florido, era sagrado, e desprender-se de uma flor era gesto sublime, coisa rara. A flor que entregava, era menos de si em si mesma e mais de si para o mundo. Retalhar-se em fragmentos, mais parece dor sem fim. Mas, se a flor que entregava brotava no coração de alguém, então, milhares de outras flores surgiam no caminho. Porque parece controvertido, mas amor que é dividido e cultivado, há de brotar, ainda que não se entenda, ainda que de forma imperceptível, como que flor do campo, no coração de alguém.  

A.C.N.A

Será você?



O telefone toca. Será você? Não foi.
Talvez não seja,
Talvez, não agora.
talvez, não aqui, comigo.

Mas talvez seja você, ao lado de outro sorriso,
que por força do acaso encontrou por ai.
Mãos não aqui, não aqui comigo.

A gente vai seguindo, por rumos incertos, por caminhos repletos de dias iguais. Por mais um minuto, por mais umas horas, talvez por toda uma a vida... a gente vai seguindo. O que nos move é o ritmo: do relógio, do impulso, do coração, da música, do pulso, do telefone, que toca. Será você?!

A.C.N.A

Ela escrevia...

Ela escrevia...
E esquecia do mundo.

Em sintonia...